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sexta-feira, novembro 10, 2006

das velocidades do olhar e do projectar

Como noutras vezes, à conta da caça às missangas com as quais componho as minhas aulas, perco-me por coisas que já não via há muito tempo. Hoje foi a vez do Bill Viola. A primeira obra dele que vi foi The Crossing (1996). O que mais me impressiona no trabalho dele é a paciência com que se constrói o acontecimento, o respirar lento que toma para si e nos impõe se o queremos seguir. Com a contemporânea dificuldade de gerirmos silêncios, vazios e pausas a sensação forte com que fiquei foi a de que parar a olhar para o lento voar da câmara é preenchedor. Completa o instante, longo ou curto, em que se esteve mergulhado. Nada, nestas propostas envolventes, substitui a possibilidade de se viver, à escala proposta pelo artista, da instalação que acolhe a imagem e o som. À falta de melhor vê-se a cassete, o dvd ou o que o YouTube nos deixa encontrar... Polaroid do acontecimento. Para quem não sabe que tem fome, aguça-a, para quem sabe a fome que tem, distrai. Deixei aqui Migration (1976).

Não deixa de me apetecer fazer uma ponte com o desenho, ou melhor, com o projecto. Este tempo que o olho “perde” a radiografar o espaço por onde se decide caminhar é, de certo modo, o mesmo tempo que já não é concedido ao projecto de arquitectura para se construir. O interessante tempo que o projectar de outros tempos menos informatizados permitia, desapareceu. A rapidez da máquina é a inquestionável rapidez do homem que pensa rápido, porque por cima está a força da rapidez de quem encomenda e deseja que tudo seja ainda ontem. A construção mastigada, que um desenho que se constrói ao correr de um lápis permite, é outra coisa. É poder pensar cada vez que se afia o tal lápis, cada vez que se ataca o estirador mais para a esquerda ou para a direita, que se afasta ou se aproxima mais. Essa relação sensual entre corpo e papel e linhas que se traçam sobre ele é a mais valia do tempo que passa. É, quem sabe, a diferença entre o tempo lento dos afectos e o tempo dos excitantes estímulos acelerados e em cadeia.
Mas não, desenganem-se os que pensem que eu não gosto da era das pós-máquinas. Não vão por aí!

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